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segunda-feira, 1 de outubro de 2007

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Cinismo e poder
Uma pausa no assunto mais crítico.

Luís Filipe Menezes ganhou as eleições internas directas para presidente do Partido Social Democrata (PSD) de 29-9-2007 a Luís Marques Mendes, o presidente em exercício.

Eleições directas para Presidente do PSD - 29-9-2007 (até às 1:45 de 29-9-2007)

...........................................Votos de militantes...............%
Luís Filipe Menezes..........................20701.......................54,1
Luís Marques Mendes.......................16334.......................42,7
Votos brancos...................................909.........................2,4
Votos nulos.......................................326.........................0,9
Votantes.......................................38270........................60,7
Eleitores........................................63035


Nas eleições internas dos partidos em Portugal é ordinária a polémica das quotas, com os pagamentos em massa, os cadernos eleitorais discutidos, a sobre-representação de secções geográficas e concelhos e poder interno de matriz caciqueira - aquilo a que em tempos chamei a "guerra dos tazos" que sujaz à guerra dos tachos. Os tazos, como as fichas, tipo cromos, que os miúdos jogam, são militantes familiares e amigos ou dependentes de algum favor, encarados como marionetas pelos caciques e caciquinhos, nomeadamente presidentes de câmara, vereadores e assessores. Nessa "guerra de tazos", que precede e sustenta tachos, a comparação do poder, qual concurso infantil de tamanhos, faz-se pelo número de tazos que cada cacique ou caciquinho tem no bolso, sendo mais importante o grande eleitor, qual "bate-fichas" de casino, que tenha mais no bolso. É uma situação que espelha o respeito que cada um dos envovidos tem pela democracia. Porque não há - nem pode haver! - moral dupla na política, com um vale-tudo interno ao partido e a promessa de respeito absoluto pela democraticidade no País: o povo percebe e pune. Também o PSD, nas várias facções envolvidas, não escapa a esta praga anti-democrática. Esta praga, exposta ainda mais pelos ataques cruzados das candidaturas, fere a legitimidade partidária, com uma gravidade que os tempos mais próximos não reduzirão.

Em minha opinião, a eleição do dr. Luís Filipe Menezes traz algumas lições:

1. A derrota de algum baronato absentista, elitista e tecnocrático, entretido na sua vida profissional, cínico no seu apoio a Marques Mendes, que entendiam como feitor da quinta, enquanto não chegava a oportunidade de uma vitória eleitoral pelo desgaste de José Sócrates. O que não significa que do lado de Luís Filipe Menezes também não estejam alguns notáveis ex-semi-retirados da vida política ou que estavam queimados e que, para ressurgir, fizeram intervir as suas hostes.

2. A derrota de alguns protagonistas que, por cálculo de oportunidade (Sócrates ainda demasiado poderoso para lhes conceder o poder) ou receio, não tiveram a coragem de se apresentar a sufrágio, como Marcelo Rebelo de Sousa, José Pacheco Pereira, Manuela Ferreira Leite, Alexandre Relvas (ex-proto-pré-candidato, cuja hesitação o penaliza), Rui Rio e o próprio Santana (apesar de tentativa de última hora).

3. A derrota de Cavaco Silva, que parece ter apostado tudo no delegado do sector legitimista Marques Mendes e acaba com o líder Luís Filipe Menezes que, sem a hostilidade anti-cavaco de Santana, não pode ser favorável à teroria cavaquista de "deixem-governar-o-Sócrates-para-ele-fazer-a-reforma-da-administração-pública". Esse comedimento de recomendação cavaquista dos jogos florais do PSD colide colide com a esperança de vida de Menezes que vai até às eleições: se perder, será pressionado a sair.

4. A vitória do militante anónimo, incomodado com a suserania dos nobres notáveis, cujo cinismo face ao partido e o desprezo das agruras do povo e a marcha da dependência do Estado, não pode consentir nem desculpar. Nessa perspectiva, as eleições directas, ao contrário do que o baronato absentista (porque ausente da luta política e cívica, cujo trabalho, que considera sujo, deixa para os idiotas e pobres de poder...) vieram para ficar. O poder vai ter de passar a ser disputado não no jogo viciado dos acordos de barões, dos grandes eleitores, em congresso, mas pelo voto dos militantes todos.

5. A necessidade de institucionalização da democracia directa, com eleição directa para qualquer cargo partidário e político, com o aprofundamento da democraticidade interna - liberdade de inscrição de militantes, regras de participação nas eleições, transparência, independência da organização de eleições (que convinha passar a serem auditadas por órgão independente das facções), prestação de contas, etc. Mais democracia directa e não o retorno à oligarquia.

6. O ocaso do protagonismo principal de Marques Mendes no partido e na política, e a travessia do deserto dos seus mais próximos, porque outros tentarão fazer a transição rápida do costume.

7. O agravamento da limitação da acção do poder judicial sobre o sistema político e os seus intervenientes, cuja imunidade será ainda mais protegida.

8. A vitória de um certo populismo autárquico, reduto de poder real do PSD, na contestação da corte lisboeta promíscua e inconsequente.

9. A maior dificuldade de José Sócrates e do Governo no curto-prazo, independentemente dos efeitos de prestígio no prazo mais longo.

10. A constatação da impossibilidade de reforma política efectiva do País nos próximos anos.


Acima do jogo partidário está, contudo, o País. O dever continua. E o devir não dispensa.



Pós-Texto: Ver ainda sobre a pressão do sistema judicial sobre o sistema político este post de José Maria Martins, que comenta com vigor a notícia do Expresso "Ameaça macabra a juiz de casos quentes", do Expresso de 29-9-2007, sobre a falta de segurança pessoal do juiz Carlos Alexandre, que terá a seu cargo a instrução do caso Portucale, Furacão, OGFE. Aqui há tempos também li àcerca de um caso semelhante de recusa e demora em conceder protecção a um juiz num caso tórrido para o poder.

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